2008-09-24

Um dia de cada vez...


Quando ainda estudava na faculdade, o meu espaço preferido para estudar era na sala, onde existia quase sempre uma televisão ligada, num som alto, na altura em que todos estavam em casa e permaneciam nessa mesma sala, a falar uns com os outros, muitas vezes ao mesmo tempo. No meio daquela confusão, automaticamente conseguia focar-me no que queria estudar. Parecia que com tanto barulho, o meu cérebro absorvia melhor todos os assuntos que necessitava compreender. Estranho, não?...

Hoje compreendo porque preferia estudar nessas alturas Quando eu estudava em silêncio, a minha mente viajava para outros lugares. Na maior parte das vezes não eram os melhores. Lá morava o meu sentimento de culpa, o meu auto-censor, as minhas angústias, a vozinha que tantas vezes apelidei como tirana e que tantas vezes me queria fazer sentir ninguém.


Na altura detestava o silêncio. O silêncio significava ter que encarar esses sentimentos e como não sabia lidar com os mesmos, fugia do silêncio. Então falava sempre imenso, estava sempre a ouvir música ao mesmo tempo que via televisão. Quando alguém se calava e o silêncio parecia instalar-se, começava a contar anedotas (algo para o qual não tenho jeito :)), fazia perguntas...

Até que um dia, já sem assunto para falar, comecei a escutar todas as pessoas com as quais me cruzava e que precisavam de alguém que as escutasse. Normalmente, pessoas que procuravam conselhos, ideias a seguir para se sentirem melhor consigo próprias. Todos os dias vivia a vida dessas pessoas. O meu tempo dividia-se em estudar (para terminar o curso o quanto antes porque o meu pai é que estava a pagar ) e encontrar as soluções mais eficazes para ajudar quem a mim se dirigia.

Um dia, um colega propôs-se a ensinar-me algo de novo (recordo que, na altura, ensinou-me como funcionavam os motores dos automóveis) em troca de o escutar e encontrar soluções para as suas aflições.


Durante anos fiz isto, vivia a vida de muitas pessoas, sem me dar espaço e tempo para olhar para a minha. Amigos, colegas, namorados, familiares...

Sempre que eu parava para dar voz ao meu interior, era invadida por emoções negativas em jeito de vozes negativas. Simplesmente, não sabia lidar com isso e refugiava-me nas histórias dramáticas que me contavam e para as quais encontrava sempre uma solução (a história não era minha...)


Foi preciso bater e bater e bater com a cabeça, para reconhecer no silêncio o meu maior aliado. Anos a fio com a cabeça cheia de ideias, opiniões, experiências que nunca vivi realmente mas que sentia como se as tivesse vivido. E quanto mais eu dava espaço a essas experiências, mais pessoas atraía com as mesmas características. O famoso efeito "bola de neve".

"A Necessidade aguça o Engenho" pelo que tive que me encarar a frio e enfrentar os meus demónios e dragões, senão acabaria por "morrer". Tantos anos a dar ideias a encontrar soluções para os outros e parecia tão difícil encontrar soluções para mim.

Simplesmente, estava viciada nessas emoções. Não foi fácil. Foi preciso a ajuda de uma grande mulher e especialista na área da psicologia, a leitura de muitos livros (e a prática do que lia), a ajuda dos verdadeiros amigos, do meu Companheiro de Alma e, principalmente, da minha vontade de mudar.

Hoje, consigo escutar-me no silêncio, ainda que com alguma dificuldade porque tal como um toxicodependente dificilmente esquece a droga, eu também tenho tendência a ter recaídas.

Costumo dizer que sou "uma mulher que ama demais"em franca recuperação com o Silêncio por aliado.














1 comentário:

Maruca disse...

Amar demais...eu costumo dizer que amar não tem quantidade, ou se ama ou não se ama.Portanto, sendo assim e tentando positivar a tua afirmação, poder-se-à escrever que és a mulher que ama e por isso...és linda.